sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Quinta da Aveleda (Penafiel)



Entrar na Quinta da Aveleda é muito mais do que entrar no fascinante mundo dos vinhos. É embocar numa história com mais de quatro séculos de vida, é conhecer os projectos de várias gerações de uma mesma família, é entender a terra e a natureza. É surpreendente em vários aspectos. Pelo exotismo da flora, pelo peculiar conjunto arquitectónico, pelos cuidadosos detalhes que enriquecem o percurso, pela história da família Guedes, proprietária, desde há vários séculos, da mundialmente conhecida marca de vinhos verdes.
Remontam a 1671 as primeiras construções na Quinta da Aveleda, nomeadamente a capela, anexa à casa principal. Foi igualmente no século XVII que os Guedes se tornam senhores da propriedade. Mas foi no séc. XIX, com Manoel Pedro Guedes – antigo deputado, visionário, romântico, exilado voluntariamente em Penafiel – que o espaço ganhou consideráveis dimensões.

A Quinta propõe aos visitantes um percurso pelas ruas e alamedas da propriedade, sinalizado num mapa distribuído na recepção. Logo no início do percurso, surge a Casa do Guarda de Cima, junto a uma das entradas de serviço, uma construção semelhante à tentação de chocolate do conto infantil de Hansel e Gretel. É uma das várias follies, devaneios arquitectónicos sem funcionalidade específica, espalhadas pela propriedade. Poucos passos à frente, no Lago dos Cisnes, outro ex-líbris da propriedade: a Janela Manuelina, resgatada da casa onde nasceu o Infante D. Henrique e donde se diz ter sido aclamado rei D. João IV. E, noutra pequena ilha, a Casinha de Chá, de estilo vitoriano, onde as crianças se divertem a recriar histórias dos livros de aventuras. Cobras, sapos, tartarugas e águias de louça, presos no tecto, compõem o cenário. Não só de vinhos verdes é feita a fama da Aveleda. No edifício da Adega Velha, repousam as barricas de carvalho francês, onde se guarda a aguardente com o mesmo nome.


Penafiel vai converter-se, durante quatro dias, na localidade de Saramago por excelência. Não tropeçar em referências ao único Nobel da Literatura de língua portuguesa vai ser uma tarefa condenada ao insucesso, tão evidentes são as marcas da sua obra espalhadas por Penafiel.
O objectivo do festival, Escritaria 2009, iniciativa destinada a explorar a memória dos escritores nacionais mais relevantes, ainda entre nós, passa por "contaminar a cidade com aforismos, frases soltas, referências históricas, cosmogonias literárias, imagens e obras plásticas que remetam para o peculiar universo de José Saramago".
Do ambicioso programa do Escritaria fazem parte não apenas os habituais colóquios, em que participam figuras como o cineasta brasileiro Fernando Meirelles, o arquitecto espanhol José Joaquín Parra e os escritores Laura Restrepo e Miguel Real, ou o lançamento mundial do novo romance do autor, "Caim", mas também iniciativas que visam aproximar a comunidade local do autor. Os exemplos deste esforço de dessacralização são tão abundantes que o palco mais frequente das iniciativas não é nenhum auditório, mas sim as ruas e praças penafidelenses. Além de frases do autor pintadas na estrada e de cartazes em forma de 'post-it' contendo frases emblemáticas da sua obra, o Escritaria vai apresentar insólitos "bancos que narram", em que, graças a dispositivos sonoros, vulgares assentos vão reproduzir gravações de excertos saramaguianos.

Entre 15 e 18 de Outubro.
Para ouvir:
http://www.tsf.pt/paginainicial/AudioeVideo.aspx?content_id=1391490